terça-feira, 6 de março de 2012

Domingos ensolarados

Para narrar o momento em que me tornei ateu, não preciso mencionar o dia em que tive acesso aos elevados conhecimentos da astrofísica, da biologia, da química. Devo dizer, aliás, que nenhum desses temas me é familiar até hoje.

Também não contarei, aqui, as peripécias de minha sabedoria prematura: não decidi viver sem deuses porque desde cedo me mostrei uma criatura brilhante e desconfiada, nascida com o questionar inscrito nos genes.

O que eu vou dizer é que meu ateísmo brotou dos domingos de manhã, no finzinho da minha infância. Recordo-me até hoje, com relativa clareza, do vestir-me com a roupa de ir à missa (nem muito arrumada, nem muito feia) no raiar dos dias santos. Lembro também da sensação ruim de perder belos sóis para ir à igreja, pra ouvir um padre que a família me ensinara a respeitar – muito embora eu não fizesse (e ainda não faça) muita ideia do que ele falava.

O estalo, por assim dizer, não foi exatamente nesse momento. Na verdade mesmo, “ateu” era coisa que sequer fazia parte do meu palavreado, até porque não costumam ensinar pra gente que dá pra viver se fé. A coisa se desenvolveu um pouco mais tarde pra mim, no meio da adolescência: além de meus pais nunca terem sido pessoas muito presentes em rituais religiosos, eu tive por essa época contato com a filosofia do Nietzsche. Eu li e reli esse respeitável senhor, até que notei algo que eu já havia percebido sem perceber: esse negócio de fé tende mesmo a roubar da gente a manhã do domingo ensolarado, a nos furtar o futebol, a nos exigir o sacrifício daquilo que nos apraz. Por que fazer isso, pensei eu? Por não encontrar resposta a essa indagação, aqui estou.

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