domingo, 16 de dezembro de 2007

Coitadinha da Margot

Margot era, já novinha, criatura muito peculiar. Tinha um caráter muito preocupado com a felicidade alheia, se sacrificando para retirar das criaturas infelizes todas as casquinhas de amabilidade e contentamento possíveis. E essa característica se refletia, inclusive, na forma como ela encarava o sexo; tinha uma tara meio estranha, quase doentia, por pagar boquetes. Achava que isso era a forma mais nobre e pura de altruísmo em termos sexuais, e via na mamada o símbolo máximo de amor ao próximo. Sonhava em satisfazer, com seus lábios carnudos , todos os homens que a cercavam, imaginando chupadas homéricas daquelas que terminam com um saco vazio e uma boca cheia.

Mas creiam, leitores, que nossa amiga via-se num impasse ideológico nunca antes vivido em toda a história do Universo: Margot tinha muito, muito nojo daquele líquido viscoso que sai do pênis masculino, a ejaculação. Da mesma forma como num conto de sei-lá-quem uma menina queria ser médica e tinha horror a sangue, a nossa protagonista Margot se via diante de um dilema quase tão grande quanto a escolha de Sofia.

Enfim, Margot padecia desse mal bem estranho, e por isso não conseguia ser feliz. Homens já a temiam, por não quererem se ver cobertos de vômito já que, convenhamos, isso é no mínimo um puta de um corte no tesão. E a menina, desesperada, não sabia o que fazer. Camisinhas não podiam ser usadas, porque a religião não permitia (Margot era católica de berço, muito devota, diga-se de passagem).Só restava a Margot rezar para que o parceiro conseguisse se ´´controlar`` por tempo suficiente. E como, segundo um anúncio que eu vi outro dia na TV, do Boston Medical Group, pelo menos um terço dos homens sofre de ejaculação precoce, o leitor deve imaginar que pelo menos um terço das relações de Margot deviam acabar de uma forma bem...huuuuuum...inusitada.

E, realmente, suas experiências boquéticas não eram das mais normais.Mas como sempre há um chinelo velho para um pé descalço, Margot encontrou do nada um fiapinho de esperança em sua vida de sanguessuga. Deu-se que, por algum capricho do destino, ela se deparou, para sua felicidade, com um belo rapaz, que tinha a estranha característica de nunca, jamais, em hipótese alguma gozar. Acostumado a ser desprezado pelas mulheres normais, ele encontrou em Margot o alento que necessitava; um preenchia o outro, e ambos perceberam que nunca um casal seria mais feliz do que eles dois.Viveram bem durante meses; ela boqueteando, ele sem jogar nada na boca da amada. Amaram-se intensamente até que, numa noite de inverno, o incontestável e inevitável destino de tudo o que vive atingiu violentamente aos dois, mesmo que precocemente e interrompendo uma felicidade ímpar.

Sucedeu que, na já citada noite de inverno, Margot, como de costume, se ocupava em boquetar o amado, enquanto este dirigia. Distraído, ele foi incapaz de, num cruzamento, ver o sinal que se tornava vermelho. Tragicamente, no mesmo momento, um caminhão colidiu com o carro no qual se encontravam os dois pombinhos, do lado da porta do motorista, fazendo com que ele morresse na hora.

Mas na iminência da morte, algo inesperado aconteceu: no último suspiro de prazer, o namorado de Margot despejou na güela da amada tudo aquilo que, por anos, não saiu do lugar. Ela, pelo contrário, não morreu na hora; presa nas ferragens e incapaz de cuspir o que havia entrado boca adentro, encontrou o mesmo destino de sua alma gêmea.

No Instituto Médico Legal, os médicos não tiveram coragem de divulgar a verdadeira causa mortis de Margot : afogamento. Mentiram que a morte se deu por conta dos ferimentos causados pelo acidente, sem contar ao mundo que, ironicamente, a boqueteira enojada morreu afogada em porra.